Todo dia é dia, toda hora é hora, tudo festa
Ainda há pouco, último dia do ano, depois de acordar, preparei uma aguinha morna com limão e sal integral para tomar e botar o organismo a funcionar, se funciona eu não sei, só sei que é assim que eu faço todo santo dia; botei a água para ferver para ovos cozidos e, ao lado, outra para o café. Enquanto isso, voltei ao quarto, dobrei o cobertor, "bati" os travesseiros, estiquei a coberta da cama, deixei tudo direitinho para, só daí, escovar os dentes. Voltei à cozinha, e depois dos 7 minutos de cozimento na água fervente, os ovos estavam prontos e a água do café também, e este tem que ser passado de três ataques, um para molhar o pó de moagem média e torra clara, outra, a segunda, para extrair os sabores e o terceiro para dar um tcham no bicho. Antes, o coador teve que receber uma lavada com água quente para tirar dele o gosto de papel: funciona, viu? Desde que o café seja um cafezão, como diz meu amigo de internet e produtor de café em Caetanópolis, Café Gerações, café especial, lá em Minas, o Alberto Martins. Tudo pronto, uns minutinhos de paz à mesa para degustar essa maravilha e começar o dia nutrido. Em que difere uma rotina dessa dos demais 365 dias que não o último do ano e o primeiro, amanhã? Em nada! Para quase todos os humanos, se não nesse luxo todo, ir cedinho para o ponto de ônibus, depois metrô, depois a pé, depois escritório ou fábrica, tanto faz, trabalhar, almoçar, trabalhar, ir embora, a pé, depois um metrozinho, depois trem ou ônibus, depois casa, depois descansar, depois recomeçar. Neste recesso brasileiro de Natal e ano-novo, a diferença é que parece a liberdade do Carnaval, de poder tudo, de beber todas e, tanto faz se para aguentar a família, de quem não se gosta (dizem as más línguas que sim, que para aturar parentes nesse período, com falsidades de abraços, de desejos de paz e fraternidade, essencial é álcool. Repito que dizem! Tô nem falando da tal confra, a festa da firma...). Como eu ia dizendo e fui interrompido por uma explicação, há uma obrigação de se esbaldar na tal ceia, que só serve para reaproveitar o que sobrou do Natal, uma semana atrás, carnes estrategicamente bem guardadas no melhor lugar da geladeira para dar uma economizada nos exageros do aniversário de Cristo, quando é melhor sobrar do que faltar, para não fazer feio praquela prima fofoqueira e aquele cunhado metido a luxuriento. Melhor sobrar do que faltar. E como sobra! Para a virada, basta comprar umas asinhas de frango, para dar entrada na churrasqueira, umas linguiças de baixa qualidade e menor preço, neguinho depois de beber umas par de cerveja, come qualquer coisa, e deixar aquela carne para o fim, para a diretoria. O que vem do Natal, empurra no meio de tudo, quando botar a mesa, quando tiver arroz e frutas. Vai que é uma beleza, ninguém nem percebe. Sempre tem uns ratos de churrasco, que comem devagar, bebem devagar e cabe uma tonelada; sempre tem uns que vão à forra, bebem logo o que trouxeram no isopor da família e ficam largados pra lá ou falando abobrinha o tempo todo pra todo mundo rir sem ninguém nem saber bem o porquê, mas ri à solta. E sempre tem uns que não aguentam o tranco e na passagem tão roncando lá pelos cantos, chinelos jogados, bermudão e camiseta na cabeça, se tiver calor. Passou a queima de fogos na TV, parece que o ano-novo só é aí, sem isso, não tem virada nenhuma, passado este momento, que tá cada ano durando mais minutos, quando a Globo mete na grades aqueles pagodeiros mais sertanejos mais fanqueiros mais uns nem isso nem aquilo, é o sinal de que é hora de levantar acampamento, catar as traias, acordar as crianças e começar a dar área. Daí a pouco, todo mundo vai embora e a casa naquele horror de bagunça, se ficou alguma idosa que veio de longe, tadinha, se oferece para começar a faxina na pia, o lugar mais cheio de coisa. Se não, fica pra amanhã mesmo, ninguém aguenta. "Ah, vamos aproveitar amanhã a churrasqueira?" Bora, chama mais uns três ou quatro, cada um traz seu isopor e vamo que vamo! Amanhã, quero só ver aonde eu vou nesse fim de feriado porque a rotina, vai ser a mesma de hoje, véspera de amanhã. Como diz aquele personagem do Auto da Compadecida, em cartaz, só sei que é assim que é. Feliz ano novo, faça dessa festa todo novo dia. "Ah, não dá": como não dá? Faça dar, ora?
(Eu penso isso, pense você aquilo)
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